[CRÍTICA] A Mulher na Janela

O psicológico de um personagem é uma das chaves para arquitetar o suspense em um longa conforme ele se desbrava, o ponto principal neste gênero, porém, vem especialmente das mãos de seus diretor e como o mesmo utiliza suas ferramentas para desenvolver a obra final. O grande Alfred Hitchcock, um dos maiores cineastas da história, ensinou isso em seus vários anos de carreira, suas inúmeras técnicas criadas fundamentam o que conhecemos hoje como suspense e se tornam verdadeiras peças soberanas que inspiram e servem de ponto de partida até os tempos atuais.

E ‌Joe Wright entrega de fato uma obra hitchcockiana com A Mulher na Janela, apenas mais uma amostra de que o Mestre do Suspense continua inspirando o gênero mesmo após tantos anos, um verdadeiro professor com lições que ultrapassam os limites do tempo. O novo longa da Netflix se apresenta claramente como uma obra de total inspiração nos trabalhos de Alfred Hitchcock, em especial Janela Indiscreta (Rear Window), cuja trama se inicia exatamente como o longa de 1954. E tal inspiração não para por aí, visto que temos bons momentos que trazem a memória Psicose (1960), da narrativa aos paralelos cinematográficos.

No roteiro de Tracy Letts, temos a psicóloga Anna Fox (Amy Adams) que mora sozinha em sua casa sofrendo de uma fobia que não a permite sair da residência, com isso, ela passa seus dias bebendo e observando seus vizinhos. ‌Em comparação, temos um pouco do que foi o recente Meu Pai, vencedor do Oscar de Melhor Ator com Anthony Hopkins, visto que quase que toda a trama se passa dentro de um único cenário e imerge o espectador no pequeno universo onde a protagonista vive, concentrando toda a tensão do roteiro em um ponto individual. Todavia, tal artimanha vem também das aulas de Hitchcock, tal qual vemos em Festim Diabólico (Rope), de 1948.

‌Da câmera ao roteiro, é partindo das bases de Alfred Hitchcock que Joe Wright realiza um bom suspense, sua construção de tensão entretém e faz de A Mulher na Janela um proveitoso filme no gênero, todavia, por conta de suas infundadas inspirações, o longa em pouco é original, uma película de baixa alto estima e sem identidade própria. ‌O roteiro demora a engrenar, e com o tempo, fica visível como essa lentidão funciona para confundir a mente do espectador ante aos eventos decorridos em tela, mas quando a narrativa enfim toma um rumo definitivo, a quebra do suspense acontece num monólogo explicativo repentino pouco alegórico e faz o longa mudar para um thriller de ação preso numa tentativa falha de plot twist, culminando num desfecho abaixo do que visto até ali.

‌A trama traz Amy Adams mais uma vez esplêndida, sua representação da protagonista melancólica e perdida em seus pensamentos é precisa, boa parte do filme traz tensão à tona pelas nuances pontuais de Adams. A relação da atriz com os demais presentes em cena é sempre liderada por ela, ainda que contracene com um elenco pesado, elenco esse sendo um dos pontos que chamam a atenção para a produção, e tal peso não é desperdiçado, porém não é de todo aproveitado, uma vez que nomes como Juliane Moore, Gary Oldman e Anthony Mackie pouco aparecem e, quando isso acontece, pouco se destacam, não pelos atores, mas por conta do próprio roteiro. Aquele que talvez mereça uma atenção maior, porém, é o jovem Fred Hechinger, cuja performance se constrói necessariamente com seu personagem e oscila tal qual o roteiro o pede, uma boa surpresa no elenco.

Tendo filmes como Orgulho e Preconceito e O Destino de Uma Nação em seu currículo (sendo inclusive este ultimo indicado ao Oscar), Joe Wright entrega agora quase que um filme experimental onde o cineasta testa suas habilidades no suspense. A Mulher na Janela nada mais é que um filho sem personalidade de Hitchcock bajulado por suas técnicas bem utilizadas, no geral, uma obra pouco convencida de que poderia ser mais do que realmente foi.

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